A minha militância hipócrita ou Projotismo
Eram meados de 2016 e eu já havia colecionado a leitura de grandes autoras sobre feminismo, classes e racismo. Já carregava um medo pelo futuro da ciência no Brasil e pelo meio ambiente em escala global. Eu tinha uma oratória impecável, toda referenciada e estava pronta para o embate com quem quer que seja. Mas em casa, os meus embates não passavam do popularmente conhecido "nem todo homem", que tem o que? a profundidade de um pires?
Bom, hoje essa fase está para lá de superada dentro da minha casa, mas teve uma briga com meu marido naquela época que eu acho que cabe demais na oportunidade de debate de hoje.
Ele me disse algo cujas palavras exatas eu não lembro, mas a mensagem foi essa: Muito lindo o seu discurso feminista, populista e o caramba a quatro, mas vc sequer sabe se manter. Você vive de cachorro quente, não sabe fazer um nada em casa, não sabe mexer num pedaço de terra, cuidar de uma planta. Enfim, ele expôs o quanto eu era dependente dele e o quanto ele via certa hipocrisia em eu querer criticar o mundo quando eu sequer sabia me virar nele. Enquanto isso, ele, que havia lido pouquíssimos textos, se educado de maneira bastante superficial sobre qualquer assunto polêmico de gênero/classe/cor, era (é) um cara que sabia fazer tudo dentro de uma casa e tinha uma justiça nas atitudes do dia a dia realmente admiráveis.
Mas claro, eu fui super reativa e mandei ele para as cucuias. Porque eu tenho uma origem bastante simples, limpei casa e fiz minha própria comida desde os 10 anos de idade. Obviamente eu nunca tive uma funcionária dentro de casa, eu sequer cresci em uma casa própria, mas era sim verdade que conforme eu fui crescendo eu fazia tudo meia boca e o mínimo necessário. Aquela feminista que enquanto morava na casa da mãe, deixava ela limpar meu quarto. Então convenhammos: ele tinha lá sua razão, por mais que doesse admitir.
Depois disso, eu passei a falar menos e fazer mais. Cuidar da minha composteira, separar certinho o meu lixo. Ser mais justa no meu ambiente de trabalho, cuidar mais da qualidade das minhas relações. Virei vegetariana e aprendi a me alimentar de forma consciente e não elitizada. Passei a prestar mais atenção em consumir trabalho de pequenas empresárias, deixar meus likes em páginas que se alinham com os meus ideais. Nesse processo eu não mudei nada em relação aos meus pensamentos, posicionamentos e estudos, mas eu me relacionei de um jeito mais concreto com o meu discurso. Eu penso que esse é o caminho mais certeiro para realmente cativar as pessoas para uma mudança de postura, com exemplos! Que a gente tome esse exemplo do Projota, o menino da vila que não sabe fazer um arroz, como uma oportunidade de olhar para dentro.
Um parênteses precisa ser feito aqui sobre capacitismo: Eu não estou falando que as pessoas só podem partir para debates nos mundos das idéias se souberem fazer um arroz, tem pessoas que não possuem condições físicas para diversas atividades. Mas estou sim dizendo que se você tem todas as condições para fazê-lo, é um pouco irônico criticar o mundo e mal saber limpar sua própria sujeira. A verdade é que o twitter está detonando o Projota, mas tem muito militante por aí que também não sabe fazer um arroz.
@mararismos
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